O encantador de serpentes - Ruy Telles
Quando criança, lá em minha Caxias do Sul, eu ficava deslumbrado com aqueles vendedores de ilusões, tendo ao seu lado, ou enrolado em seu pescoço, uma cobra Jiboia; se formava uma multidão de curiosos, dentre eles, eu. Ele não parava de falar, vez ou outra acariciava a cobra com a mão e falava: “fique quietinha, Alexandrina” virava para a plateia e dizia: “passo a mão na cabecinha dela e me lembro de um careca, o qual é mais perigoso que ela, mas eu sou nordestino da região dos Garanhuns; fui para São Paulo e descobri o preço de cada um. Se consegui domesticar a Alexandrinha, o resto do ninho de cobras foi fácil”. Ele falava, falava e falava, até ter a oportunidade de vender seus xaropes que curava de calo no pé a câncer na bexiga. Todos sabiam que era golpe, mesmo assim compravam aquela garrafada de ilusões. Com o tempo descobriam que foram passados para trás, mesmo assim ele justificava a falha e jogava a culpa na secretária que não seguiu as regras, ou melhor: ela não tem mais regras, pois passou da idade. De repente uma correria; era a “políça” que chegou e levou ele para a cadeia, por estar enganando o povo e colocando a culpa nos auxiliares, que o traíram, pois ele “não sabia de nada”. Na cadeia não foi diferente, descobriu que a justiça é injusta. Comprou a fidelidade da cúpula, e acabou saindo pela porta da frente, exigindo desculpas de quem o prendeu, dizendo ser ele um charlatão; se dizia um homem invejado, e que não existia, no País, ninguém mais honesto que ele. Voltou a colocar sua cobra no pescoço e prometer cura para todos os males que afetam os brasileiros. Se você acredita no homem da cobra, não serei eu, que cresci e descobri que existem pessoas que gostam de serem enganadas, acreditando que a garrafada de ilusões cura quase tudo, menos ignorância.
Ruy Telles - Sobradinho